EUA: 18 TIROS DA POLÍCIA. 2 NEGROS DESARMADOS. UM MORTO E UM MORIBUNDO. QUAL A (DES)CULPA?
- TXV
- 24 de ago. de 2020
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N. Talapaxi S. / TXV – 24/agosto/2020

Num momento em que os Estados Unidos passam por uma discussão efervescente sobre a conduta da abordagem violenta da polícia aos cidadãos negros, desencadeada pela morte de George Floyd por um policial branco, há três meses, em Minneapolis, as cenas de mais dois negros baleados pela polícia, mais que que chocar, vêm colocar mais lenha na fogueira dos ânimos e dos debates.
A mais recente e mediática dessas cenas, é a do homem identificado como Jacob Blake. Pelo que mostra o vídeo que flagrou a barbaridade, andando e totalmente desarmado, ele contorna um carro (SUV), seguido por dois agentes da policias com armas em punho, apontadas para o cidadão. Quando Jacob tenta entrar no carro pelo lado do motorista, por trás um dos policiais puxa-o pela camisa ao mesmo tempo que dispara sete tiros na direção da vítima.
Aconteceu na tarde de domingo (23) em Kenosha, uma cidade com pouco mais de 100 mil habitantes, localizada no Estado norte-americano do Wisconsin, há 50 quilômetros de Milwaukee, a maior cidade do Estado, para onde Jacob Blake foi levado e está internado no Hospital Froedtert, gravemente, lutando pela vida.
O ato de covardia da polícia foi assistido pelos três filhos da vítima - de três, cinco e oito anos. Eles estavam no carro, segundo o advogado Ben Crump, contratado pela família. O advogado, disse também a imprensa, que os policiais já tinham usado um “taser” (arma de choques) em Jacob, antes de o terem seguido, e um deles disparado sobre o homem.
As informações disponíveis até agora dão conta que a Polícia de Kenosha foi chamada por causa de uma briga “doméstica”. No entanto, ainda não se sabe quem fez a chamada. E Jacob teria interferido de alguma forma nessa briga, no intuito de apartar os envolvidos.
Há mil 660 quilômetros dali, em direção ao sul, na cidade d Lafayette, no Estado de Lousiana, na sexta-feira anterior ao do dia da abordagem a Jacob, um homem negro de 31 anos, foi baleado várias vezes pela polícia, num posto de gasolina enquanto se afastava dos agentes.
De acordo com o Daily Advertiser, o homem identificado como Trayford Pellerin, foi cercado por seis policiais. Enquanto os agentes disparavam 11 tiros sobre o cidadão, uma testemunha gravou toda a cena em vídeo.
Um comunicado da Polícia do Estado da Louisiana à imprensa relata que as autoridades foram chamadas a uma loja de conveniência local às 20h para investigar um "distúrbio" em que uma pessoa - supostamente Pellerin - estava armada com uma faca. Quanto a polícia tentava detê-lo, ele se afastou da cena. Os agentes o perseguiram a pé, dispararam “tasers” sobre o homem, que foram ineficazes para detê-lo. E quanto Pellerin tentava entrar numa loja de conveniência os policiais dispararam. 11 tiros. Transportado para um hospital local, o homem não resistiu aos ferimentos e morreu.
O sábado em Lafayette foi de protestos pela morte de Pellerin. Os manifestantes, mais uma vez, se levantaram contra a violência policial; entraram em confronto com a polícia; e bloquearam o tráfego perto de uma delegacia de polícia.
No caso de Jacob, a imprensa local relata que uma grande multidão apareceu no local e pequenos incêndios foram provocados. A agitação dos protestos levou as autoridades da cidade a emitirem um toque de recolher até as sete horas desta segunda-feira. A polícia pediu que as empresas considerassem a necessidade permanecer fechadas "devido a vários roubos de armas e a chamadas por causa de tiros".
As manifestações prosseguem. O tribunal e o prédio administrativo foram fechados durante a segunda-feira, e todas as audiências do dia foram adiadas, segundo informação do condado emitida no Facebook.
O que chama atenção nos dois casos e que mostra que os Estados Unidos, apesar das grandes discussões raciais pelas quais estão passando, estão bem longe da resolução desse dilema, é a atitude da polícia dos dois Estados envolvidos. Tudo indica que aparentemente os protocolos continuam os mesmos, e não contribuem para apaziguar os ânimos protestantes da população, sobretudo a população afrodescendente.
Ainda que Pellerin estivesse armado com uma faca, que tivesse se afastado dos agentes desacatando as ordens de parar, ele foi baleado pelas costas. E 11 tiros não justificam nenhuma ação de legítima defesa por parte da polícia. Ademais, não se tratava de um agente apenas perseguindo o cidadão, mas de seis agentes armados.
Mesmo assim, enquanto o Departamento de Justiça do Estado de Luisiana e sua Divisão de Investigação Criminal dizem que estão investigando os disparos que mataram Pellerin, segundo o Daily Advertiser, os policiais envolvidos estão em licença administrativa remunerada.
E a resposta das autoridades de Kenosha, no caso de Jacob, não é diferente. Os dois agentes envolvidos estão em licença administrativa, enquanto a divisão de investigação criminal do Departamento de Justiça de Wisconsin conduz a investigação do incidente. E só dentro de trinta dias um relatório será apresentado aos promotores.
O sindicato da polícia, que representa os policiais pediu ao público para suspender o julgamento – referindo-se aos protestos que tomaram conta das ruas. Suspender o julgamento até que o Departamento de Justiça do estado conclua sua investigação. O quê que se quer dizer com isso? Que, se as investigações concluírem que o policial cometeu um homicídio, os protestos podem voltar às ruas? Mas que, se as investigações concluírem que o policial agiu em “legítima defesa”, nada há a fazer?
"Como sempre, o vídeo em circulação atualmente não captura todos os meandros de um incidente altamente dinâmico. Pedimos que vocês evitem julgar até que todos os fatos sejam conhecidos e divulgados", disse Pete Deates, presidente da Associação Profissional de Polícia de Kenosha.
É certo que as depredações, incêndios e outras formas violentas da reação popular não pode sem consideradas como positivas, nem são as ideais. Mas são consequências que se podem evitar, com atitudes que indiquem realmente mudanças de paradigma na conduta dos agentes policiais.
Ben Crump, o advogado da famila de Jacob, é o mesmo que representa a família de Pellerin. No caso de Pellerin ele pede a demissão dos policiais envolvidos. Certamente, sobretudo caso Jacob venha a falecer, pedirá o mesmo para o policial que disparou os sete tiros.
"A família e o povo de Lafayette merecem honestidade e responsabilidade daqueles que juraram protegê-los - a Polícia de Lafayette", disse Bem Crump. Ele é conhecido por representar famílias de negros vítimas da policia, como George Floyd. Para ele “os policiais envolvidos deveriam ser demitidos imediatamente por suas ações repulsivas e fatais”.
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